sábado, 22 de novembro de 2014

1984 – George Orwell

 

Winston, herói de 1984, último romance de George Orwell, vive aprisionado na engrenagem totalitária de uma sociedade completamente dominada pelo Estado, onde tudo é feito coletivamente, mas cada qual vive sozinho. Ninguém escapa à vigilância do Grande Irmão, a mais famosa personificação literária de um poder cínico e cruel ao infinito, além de vazio de sentido histórico. De fato, a ideologia do Partido dominante em Oceânia não visa nada de coisa alguma para ninguém, no presente ou no futuro. O’Brien, hierarca do Partido, é quem explica a Winston que 'só nos interessa o poder em si. Nem riqueza, nem luxo, nem vida longa, nem felicidade - só o poder pelo poder, poder puro.'

Como estou tentando sair da minha zona de conforto literária (aka fantasia e ficção histórica), já fazia um tempo que eu estava para ler este livro. Ele estava só me esperando na estante. E não me arrependi dessa guinada. Eu já tinha visto coisas boas sobre o livro, e pude comprovar que é mesmo muito bom.

Winston Smith, o protagonista de 1984, é um homem de 39 anos, comum, que trabalha para o Ministério da Verdade, ou Miniver em Novafala. Ele é encarregado de ler e corrigir antigos jornais e publicações, editando de acordo com o que o Partido quer que seja a verdade. Complicou? É assim: suponha que no Brasil o governo controle a imprensa, e a distribuição de chocolate para cada cidadão. Ano passado nossa cota era de 30 g, mas ontem saiu um edital dizendo que nossa nova cota é de 20 g. É trabalho de Winston ir atrás da Folha de São Paulo do ano passado, encontrar o artigo que diz que nossa cota é de 30 g e corrigir, dizendo que agora é de 20 g. Ou se por acaso saísse uma estatística desfavorável ao governo, é obrigação de Winston encontrar o dado e alterar o número a fim de que o Grande Irmão apareça como grande salvador da pátria, e desta forma, assegurar que todos amem o Grande Irmão.

“Foi informado de que houvera inclusive manifestações de agradecimento ao Grande Irmão pelo fato de ter elevado a ração de chocolate para 20 g por semana. Sendo que ainda ontem, refletiu, fora anunciada a redução da ração para 20 gramas por semana. Seria possível as pessoas engolirem aquela, passadas apenas vinte e quatro horas do anúncio? Sim, engoliam.” (p. 75 – 76)

Winston vive na Oceânia, uma das três potências que restaram depois das guerras atômicas. A Oceânia no momento está me guerra com a Eurásia, e em paz com a Lestásia, mas essas guerras se alternam. Só que pela mutabilidade do passado, sempre parece que as guerras com cada uma das nações vizinhas independentemente sempre aconteceu. Assim, o controle do governo sobre a população é total. Até mesmo pensamentos são proibidos, e sempre, sempre, a vigília do Grande Irmão pelas teletelas. Os trabalhadores do governo, que vivem melhor, mas tem ainda menos liberdade que os proletas, sempre devem usar um macacão horroroso como uniforme. Em outras palavras, é o comunismo levado ao extremo.

Mas Winston não se encaixa nesse perfil dos habitantes de Oceânia. Ele tem uma mente inquieta e curiosa, reflete muito sobre o que acontece, como no trecho acima, mantém um diário, o que é contra a lei, por se tratar de um pesamentocrime, e sonha com uma revolução dos proletas. Para ele, eles são o futuro, eles são os vivos. Não que Winston escape totalmente do controle do Grande Irmão. Ele tem medo sim de ser descoberto, e quando aparece em sua vida Julia, ele pensa logo que tem que eliminá-la para se salvar.

Só que Julia n]ao quer denunciar Winston. Ele na verdade o ama, e a partir do momento que ela entra na vida de Winston para valer, o livro fica mais legal. É aí que Winston realmente acorda, e começa a desafiar, a seu modo, o sistema. Veja bem, até mesmo manter um relacionamento com alguém é proibido, a não ser que seja aprovado pelo Partido. Sexo só serve mesmo para fins de reprodução. E ao se relacionar com Julia, Winston está quebrando um dos grandes paradigmas do Partido. Julia pertence a uma facção, vamos dizer assim, do Partido, que usa uma faixa vermelha na cintura, sinal de castidade. O que não a impediu de manter relações sexuais com diversos parceiros ante de Winston, incluindo membros proeminentes do próprio Partido, que prega o fim do orgasmo. Julia odeia o Partido, e encontra em Winston um companheiro ideal. Ela é o ponto de alívio do livro.

E assim, Winston e Julia levam a vida, se escondendo do Partido e planejando a Revolução. Winston nesse sentido é mais ativo que Julia. Ela, até por ser bem mais nova que ele, se rebela nas palavras, mas não se interessa muito pelo que realmente está por trás de tudo. Até que Winston conhece no trabalho O´Brien. Instantaneamente, Winston sente uma conexão com O`Brien, e começa aí uma amizade improvável. O´Brien faz parte de um grupo contrário ao Partido, chamado de Confraria, e convida Winston e Julia a fazerem parte dele, o que os dois estão mais que preparados e dispostos a fazer, custe o que custar. O`Brien é mais soturno que Winston e Julia.

A narrativa é densa, mas não difícil. Não é sentimental, mas bem prática, e concisa. E também bem descritiva, (SPOILER) as cenas de tortura de Winston são angustiantes, bem como a descrição da vida na Oceânia. Esqueci de falar que o governo é absolutamente totalitário, e que não há noção de indivíduo, e as pessoas vivem (mal) em uma total ilusão. O livro é muito bom, só não ganhou 5 estrelinhas no skoob por motivos que vou explicar no próximo parágrafo, mas é muito bem estruturado e desenvolvido. Leitura obrigatória.

(ATENÇÃO! SPOILERS NESTE PARÁGRAFO! SE VOCÊ NÃO LEU O LIVRO, PULE!) O que não me agradou. Winston tenta começar uma Revolução, mas ela acaba não acontecendo. Winston e Julia são traídos, presos e torturados, e no fim, o Partido continua no poder, as pessoas continuam tão alienadas quanto no começo, e Winston se dobra às regras do Partido. Eu queria que houvesse essa revolução, e que o Grande Irmão fosse destronado. Por outro lado, como desconstrução do indivíduo, o livro é perfeito. E a frase final do livro é bem forte, e também uma grande sacada. E veja bem, não estou diminuindo a narrativa de George Orwell, acho que o objetivo dele era exatamente esse, mostrar que todos nós temos o nosso ponto de quebra, e que podemos ser dominados. E nesse sentido, o livro é brilhante. Genial mesmo. E temos que levar em consideração que livro foi escrito e publicado em 1949, logo depois do fim da II Guerra Mundial, o mundo acabava de ser dividido em dois, e o comunismo era visto como o grande mal. E a narrativa de George Orwell reflete exatamente isso, assim como Mordor representa a Alemanha nazista e Sauron é a personificação de Hitler para Tolkien. Uma distopia densa e uma aula de História, é isso que 1984 é.

Trilha sonora

Só consegui pensar em Another brick in the wall, do Pink Floyd, e ela é perfeita não só pela letra (we don´t need no education, we don´t need no thought control), mas porque o clipe  (que eu acho extremamente perturbador, aliás) resume bem o que eu imagino como a vida na Oceânia.

Filme

O filme de 1984 (o ano de lançamento, não o nome) é muito bom também. Tão denso e perturbador quanto o livro, com atuações maravilhosas de John Hurt e Richard Burton. A fotografia é sombria e a ambientação é rústica e decadente, combina com o clima do livro. E é bem fiel ao livro também, as coisas só acontecem mais rápido. Mas, se você não assistiu, eu recomendo que leia o livro primeiro, justamente porque por ser mais rápido, há a possibilidade de você se perder um pouco nos termos em Novafala e na estrutura geral.

Se você gostou de 1984, pode gostar também de:

  • A Revolução dos Bichos – George Orwell;
  • Admirável Mundo Novo – Aldous Huxley;
  • Farenheit 451 – Ray Bradbury;
  • Laranja Mecânica – Anthony Burgess;
  • Jogos Vorazes – Suzanne Collins;
  • Divergente – Veronica Roth.

3 comentários:

Jéssica Soares disse...

Oi, Fê! Tudo bem?
Eu acabei assistindo o filme primeiro e não tive a oportunidade de ler, de qualquer forma, se curti a adaptação, acredito que o livro deve ser realmente ainda melhor! Comprei recentemente outra obra do Orwell, "A Revolução dos Bichos", por indicação de uma professora de Sociologia e o que eu acho mais interessante são as reflexões que as histórias do autor trazem. É uma aula de história, mas você pode relacionar com um bocado de outras disciplinas e realizar discussões incríveis! É ótimo quando livros assim são lidos, espero poder conferir logo o "1984"! Bjs
Jess

Nadia Viana disse...

Oi, Fê. Adorei a resenha. Gostei muito do livro e do filme. As discussões suscitadas são interessantes o que torna o livro obrigatório. Sem falar que o gênero Distopia é um dos meus preferidos.
Beijos.

Fernanda Cristina Vinhas Reis disse...

Oi meninas!

Jess, leia sim, que você vai gostar. Eu também tenho A Revolução dos Bichos, e vou ler logo,logo.

Na, realmente, um livro obrigatório. Uma aula de História.

Beijos!